quarta-feira, 1 de junho de 2022

Depressão funcional

    Quando ouvi esse termo pela primeira vez eu achei que era mais um termo chique inventado dentro das salas de aula de psicologia para modernizar o que o pai da psicologia havia traçado como transtorno que podemos desenvolver ao longo da vida. Eu nunca me dispus a estudar a psicologia, e sei que ela é muito mais complexa, sei que existem vertentes que simplesmente tornam os ensinamento de Freud apenas como ponto de partida, e por isso eu considerei o termo funcional depois da depressão como um enfeite desnecessário. Mais o meu diagnostico continuava o mesmo, depressão funcional, recebi esse diagnostico aos 26 anos durante um curso técnico de radiologia que fiz no Hospital das clinicas de SP. Pela proximidade com a área e a facilidade em conseguir o atendimento no Instituto de psiquiatria de lá eu fui fazer meu tratamento para depressão.
    Já me leram aqui no blog falando de como eu sinto as energias que nos rodeiam e respeito esse universo mais principalmente o universo que cada um atrai pra si. E nesse momento consegui levar minha mãe pra se tratar também, e ela teve o diagnostico de Bouderline. Conversa que ja tive comigo em outro post. Na minha cabeça imatura da época era mais uma forma de o médico dizer que ela tinha problemas que precisavam ser tratados. Por escolhas pessoais minhas eu decidi sair da capital, recusar uma proposta de emprego muito boa e voltar para o interior onde nao arrumei emprego, mais fui atrás de acompanhamento medico psiquiátrico quando percebi que estava entrando em depressão de novo. 
    Talvez a decepção por nao ter conseguido um bom emprego na cidade que eu morava, e que morei quando fiz o curso, ou a quebra de confiança que aconteceu entre mim e meu primeiro marido, ou mesmo a obesidade que naquele momento ainda nao era tão evidente, já que eu sempre fui gordinha. Eu realmente nao sei dizer, mais me lembro de ter tentado de varias formas enviar currículos, entregar currículos, e alcançar esse tão almejado emprego como técnica em radiologia. Dois anos depois percebi que era impossível, me dediquei então aos concursos públicos e realmente fui aprovada, me preparei muito para as provas e consegui bons resultados, mais nunca na posição que me chamariam dentro das vagas disponíveis.
    Foi uma prova pra cidade de Jaguariúna onde abriram vagas para varias cidades em redor e por motivos de aposentadoria dos atuais técnicos da época precisavam de muitos técnicos. Me lembro que o numero de vaga excedia e muito a posição que eu tinha conquistado no ultimo concurso que participei. Praticamente me dediquei todos os dias por 6 ou 7 horas seguidas de estudos, depois de revisão. Eu dormia com um áudio gravado que fiz sobre os 206 ossos do corpo, sobre o nome das articulações, sobre as partes de um vertebra e sobre os pontos de referência para uma boa radiografia, das partes mais solicitadas. Me lembro de ter feito resumos escritos e depois feito gravações sobre cada resumo me preparando pra essa prova. E no dia eu acordei e não sabia dirigir ainda, e dependendo do meu marido na época confiei que ele conseguiria me levar, mais ele arrumou um suposto amigo que sabia exatamente onde era a prova e na espera por esse amigo perdi a possibilidade de fazer a prova.
    A decepção foi tão grande que eu nem soube expressar na hora, quando cheguei em casa, eu chorava destruindo as fitas gravadas e jogando os resumos fora. Eu so chorava e destruía tudo. Não me lembro como mais daquela época só sobrou um livro de anatomia radiológica e que não foi destruído com as outras coisas. Até as apostilas do curso eu destruí de raiva e me decidi a nao depender de mais ninguém pra chegar a um local de prova ou em qualquer compromisso importante. Foi naquele momento, hj escrevendo eu percebo, eu entendi que precisaria fazer por mim o que ninguém faria, por mais que me dessem esperanças eu nao podia confiar na oferta de ajuda de ninguém.
    Com o diagnóstico de diabetes em 2008 eu resolvi dar um basta nos meus problemas com comida e fui atrás de algo que estava virando moda, reeducação alimentar, um caminho muito mais difícil de seguir quando se quer resultados rápidos de emagrecimento, mais muito mais satisfatório no resultado a longo prazo. E eu posso dizer que consegui. até os dias atuais eu já posso fazer substituições alimentares que me ajudam com diferentes coisas e eu estou muito satisfeita por estar como estou nessa questão alimentar. Já sobre a depressão... anos, mudanças alimentares, marido que foi e marido que entrou na minha vida, gestação de alto risco, parto prematuro e 3 meses de UTI neonatal, marido 2 que foi também, me fizeram ter outra visão sobre esse funcional depois da depressão.
    Deprimi de verdade e de forma muito profunda quando descobri a diabetes depois de perder mais de 20kg. Cheguei a pensar na bariátrica naquela época, mais minha vontade de viver era tão pouca que eu nao fui, me agarrei a desculpas e objeções que hoje vejo eram futilidades. Certamente meu processo de reeducação alimentar teria sido menos confuso de explicar e entender se eu houvesse aceitado a cirurgia naquela época. Mais como ja falei aqui as energias que nos rodeiam e nos impulsionam, nos influenciam colaborando com o que vivemos. E naquela época minha energia ainda nao estava circulando nos padrões de vitória e auto reconhecimento que estão hoje em dia.
    Eu posso dizer como uma depressiva funcional que a depressão é uma merda, uma doença que nos rouba a felicidade e qualquer possibilidade de ser feliz, porque tudo absolutamente tudo perde a graça. Não estaria dizendo nenhuma novidade, e pra quem tem depressão então é só mais um texto de reflexo das próprias emoções. Muito se fala sobre depressão, mais pouco se fala sobre esse termo que acompanha muitas pessoas como eu. Passei por uma depressão profunda, entendi racionalmente a necessidade de continuar vivendo. E nesse entendimento comecei a vier a vida de forma mecânica e automática, perigosamente feliz por fora e amarga por dentro, eu Gisella consegui tornar em ironia as situações controvérsias que eu tinha emocionalmente ao estar em alguma situação.
    Meu auto conhecimento me ajudou e me fez ficar bem sensível as minhas alterações de humor ao ponto de conseguir falar claramente com o psiquiatra a necessidade de alguma medicação pra me segurar na beira do abismo antes que eu caia de novo. Mais isso não me livra da sensação de vazio sem graça que me acompanha com frequência em diferentes situações. Escrever aqui era um refugio que me dava uma sensação muito boa, mais depois percebi que nesse mundo digital acabei me obrigando a escrever e escrevi coisas que na verdade nao eram o reflexo do que eu realmente queria dizer. E nisso me perdi da essência que eu quero que seja esse blog. Estou com esse texto buscando resgatar isso, porque esse refugio me faz muita falta.
    Sou uma pessoa que sofre de depressão funcional e nunca compreendi direito o que é isso ate entender que eu sou depressiva, mais nao vivo com depressão. Confuso, porque as pessoas que não sabem o que é esse sentimento não vão conseguir captar a mensagem e está tudo bem, mais quem sente a depressão no fundo das suas entranhas percebe o quanto isso é parecido com os próprios sentimentos. Somos comunicativos, vivemos nosso dia a dia sem demonstrar a tristeza que nos assola ao ficarmos sozinhos e com nossos próprios medos e angustias, muitas vezes sem nexo ou sentido algum, mas que nos deixa insones e nos cansam de tal maneira que nem falar sobre isso se quer mais. Porque sempre e tudo que ouvimos quando falamos sobre isso é: mais vc sabe o que é depressão, vc nao parece ser depressivo. 
    Sabe porque quem não entende ou mesmo quem supostamente entende disso fala assim? Porque pra eles a depressão passou tanto tempo sendo estigmatizada como algo que era frescura que adicionar um termo como funcional é além da capacidade naquele momento da vida da pessoa. Eu poderia dizer que eu passei por esses momento de incompreensão da minha doença, mais depois de conseguir viver até aqui sem passar noites insones e muitos motivos de tristeza superados com desenvoltura emocional eu me aceitei depressiva funcional. São momentos que vem de uma depressão muito grande e que me tolhe a vontade de continuar cheia de alegria e me tira o entusiasmo de tudo que me dá alegria rotineiramente. E sou funcional, porque mesmo tendo esse sentimento algumas vezes mais intenso outras como algo bem no cantinho do meu quadro de emoções, eu me coloco de pé, arrumo minha filha, brinco com ela, limpo minha casa, faço nossa comida e converso com meus amigos e amigas pelo telefone. 
    Sou super interessada em varias coisas, e gosto de verdade das coisas que eu faço. Mais enfrento momentos de desgostar de tudo isso, inclusive já comecei a fazer um curso diferente na intensão de fazer algo mais envolvente. Então o problema não esta em me envolver com algo, mais em me manter envolvida e interessada. Por esse motivo desisti de relacionamentos amorosos. Nao me sinto bem em me envolver com alguém que não vai ser envolvente pra mim por muito mais que alguns meses ou menos, e despertar sentimentos nos outros é algo completamente injusto e sei que machuca muito, porque ja fizeram comigo; não farei com outra pessoa. Assim como amizades, as poucas que mantenho eu faço questão de manter e busco me interessar mesmo quando me sinto menos envolvida, mais fazer novas amizades? Definitivamente nao cultivo esse sentimento em ninguém, apenas me permito receber e retribuir a amizade que recebo das pessoas que vou conhecendo na vida. Algumas ficam, outras passam, outras interagem e nos tornamos conhecidos. Mas chamar amigo, isso eu reservei a poucos que fazem parte da minha vida.
    O fato é que ser depressivo funcional faz de mim uma pessoa comum. E quando me perguntam sobre como é ser assim, eu so digo que é. Vivo minha vida, sem rompantes de alegrias, curtindo as pequenas coisas nos momentos que me fazem bem e buscando nao supervalorizar as coisas ruins que sinto e passo nos meus dias. A vida é simples, e ver a alegria com que as pessoas vivem a vida delas me faz pensar em como pode mais de 50% de uma população inteira ser depressiva e achar que é apenas um estado de tristeza constante. Não não é uma tristeza constante, é uma tristeza patológica que faz a vida parecer cinza e tudo que acontece por mais empolgante que seja será apenas mais alguma coisa que acontece. Isso é a depressão funcional que me atinge, e que eu vejo atinge muitas pessoas que eu conheço.